A obra da Engorda da Praia de Ponta Negra, um dos ícones mais reconhecidos de Natal-RN, tem sido objeto de controvérsias. O projeto visa enfrentar a erosão costeira e proteger a infraestrutura urbana da região.
- Apesar dos benefícios esperados, a forma como o projeto está sendo realizado e seus possíveis impactos têm provocado intensos debates e preocupações entre ambientalistas, residentes, empresários e autoridades locais. Na segunda-feira (12), manifestantes e autoridades políticas invadiram a sede do Instituto de Desenvolvimento Econômico e Meio Ambiente (Idema) e intensificaram o debate sobre a obra.
- Inicialmente, prevista para custar R$ 73 milhões, a engorda da praia de Ponta Negra teve seu orçamento revisado para R$ 107 milhões. Isso significa um aumento de 42,67% no investimento total necessário para a obra. O Ministério da Integração e Desenvolvimento Regional está revisando o plano de trabalho e responsável pela liberação dos fundos para a execução dos serviços.
LICENÇA DE INSTALAÇÃO E OPERAÇÃO
Em entrevista à Band RN, a professora de Direito Ambiental do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte , Brenda Camilli, retirou algumas dúvidas sobre a Licença de Instalação e Operação para a obra da Engorda de Ponta Negra.
Muito se fala sobre a Licença de Instalação e Operação para a obra da Engorda de Ponta Negra. Mas, de fato, o que é essa licença?
O licenciamento ambiental é um instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente, que possui algumas etapas que, a depender do órgão ambiental responsável, podem sofrer algumas variações em sua nomenclatura. As principais etapas são a Licença Prévia, a Licença de Instalação e a Licença de Operação. A Licença de Instalação e Operação ocorre quando se unifica os procedimentos do licenciamento de instalação e do licenciamento de operação. Através dela o órgão ambiental autoriza, em uma única fase, a instalação do empreendimento ou da atividade.
O Idema é o órgão responsável por emitir essa licença no estado, mas outro órgão, como a própria prefeitura, poderia emitir? (Caso tivesse pessoal e estrutura suficientes para atender a demanda).
A competência para o Licenciamento Ambiental segue os documentos normativos existentes. Em suma, é relevante observar o que está sendo licenciado. Além disso, observar o critério da extensão do dano ambiental para determinar se ficará a cargo do órgão ambiental federal, estadual ou municipal. O Idema foi o órgão que emitiu a licença prévia para a engorda da praia de Ponta Negra, pelo que é o órgão competente para analisar e, possivelmente, emitir a Licença de Instalação e Operação.
Dentre outras razões, mas também, por se tratar de uma área envolvendo terra da União (da Marinha), a competência para o procedimento de licenciamento deveria ser de um órgão ambiental federal, no caso, o IBAMA. Contudo, em 2023 houve uma reunião de alinhamento, em Brasília, em que participaram representantes da Prefeitura de Natal, do Idema e do Ibama, pelo que ficou estabelecido que todo o procedimento administrativo referente ao aterro hidráulico de engorda da Praia de Ponta Negra ficaria com o Idema. Assim foi feito.
Quais as implicações ao tentar acelerar o processo de emissão da licença, na sua opinião?
Em minha opinião, é importante respeitar o trâmite legal para que se diminuam os riscos de danos ao meio ambiente em obras potencialmente capazes de gerar algum tipo de desequilíbrio ambiental. O princípio ambiental da precaução recomenda cautela quando não se sabe, ao certo, os riscos das intervenções humanas, quando há a “incerteza científica”, por isso se faz tão relevante aguardar o trâmite de análise adequado dos responsáveis técnicos pela conferência dos elementos necessários à evolução para uma nova etapa do processo administrativo, qual seja, a emissão da licença de instalação e operação. Quando se fala em questões ambientais, de fato, é sempre melhor prevenir do que tentar remediar, já que, em muitas situações, é impossível restabelecer o estado em que as coisas se encontravam antes da intervenção. Caminhando-se com segurança, previne-se e, inclusive, acham-se alternativas para se evitar um possível prejuízo ambiental. Tais prejuízos ultrapassam a esfera individual da população e costumam ser impossíveis de quantificar de forma pecuniária, diante do seu caráter difuso. Entendo, pois, que é possível buscar alternativas para um risco conhecido após um estudo, mas é muito difícil criar alternativas após riscos incertos, não sabidos, muitas vezes pela forma açodada em que se desenvolveu algum processo.
Quais problemas socioambientais poderão aparecer no futuro caso a licença seja emitida sem uma análise mais detalhada? A responsabilidade recairá sobre o órgão que autoriza a obra (o Idema, neste caso)?
É difícil apontar, com segurança, os problemas socioambientais que poderão aparecer em caso de uma análise superficial ou açodada do que precisa ser analisado para a evolução das etapas do processo de licenciamento. Inicialmente, é oportuno olhar para as comunidades pesqueiras, que sobrevivem da pesca, e para outros trabalhadores que sobrevivem das atividades turísticas da praia, buscando alternativas de sustento enquanto a obra estiver sendo realizada e, também, após concluída, já que toda a cadeia alimentícia da região possivelmente será alterada em face da remoção de sedimentos do fundo do oceano, levando-se a uma reorganização do ambiente local, dos nutrientes e da fauna.
Estudos indicam que o aterramento para a ampliação do Porto de Suape pode ter provocado um desequilíbrio ambiental, modificando a quantidade de peixes que habitavam a região, podendo ter influenciado na presença dos tubarões e na mudança de seus hábitos. A situação aqui, felizmente, parece ser outra, contudo, é importante que todos os aspectos técnico-científicos sejam observados adequadamente antes do início da obra.
Os órgãos ambientais podem responder por eventuais falhas em suas análises e concessões na esfera administrativa, civil e penal, pelo que devem, por óbvio e por ofício, serem muito diligentes em seus encaminhamentos. O artigo 67 da lei dos crimes ambientais, a título de exemplo, prevê uma pena de detenção de um a três anos e multa para o funcionário público que conceder licença, autorização ou permissão em desacordo com as normas ambientais, para as atividades, obras ou serviços cuja realização depende de ato autorizativo do Poder Público.