No coração do Rio Grande do Norte, onde o sol se deita mansamente sobre as terras áridas da Caatinga, ergue-se uma indústria que molda o próprio barro da terra em telhas e tijolos. Entre os aromas de argila e o calor das chaminés, um setor ancestral se reinventa sob o olhar atento dos ceramistas. É uma história de transição, na qual o passado se entrelaça com o futuro.
A busca pela sustentabilidade transforma fornos e técnicas ancestrais em símbolos de uma nova era. Este é o setor de cerâmica vermelha do RN, um exemplo vivo de como o cuidado ao meio ambiente e a eficiência energética se fundem em cada peça que nasce do calor dos fornos. Vargas Pessoa e Rinaldo Tavares são exemplos de empreendedores que investiram num modo sustentável de produzir.
O Rio Grande do Norte se sobressai no cenário nacional não apenas pela sua beleza natural, mas também pela indústria de cerâmica vermelha, que tem se empenhado em alcançar novos patamares de sustentabilidade e eficiência energética. Em um contexto onde temas como transição energética e eficiência são cada vez mais urgentes, o setor cerâmico potiguar tem se destacado como um exemplo de adaptação e inovação.
De acordo com dados da Associação Nacional da Indústria Cerâmica, o setor produzia em 2021 mais de 8 milhões de produtos (blocos e telhas) por ano. O Brasil também se destaca globalmente no setor de revestimentos cerâmicos e louças sanitárias, ocupando a posição de terceiro maior produtor e consumidor do mundo. Além disso, o país é o sexto maior exportador, comercializando seus produtos em mais de 110 nações. Esse segmento industrial contribui com 6% do PIB da indústria de materiais de construção.
CENÁRIO DO RIO GRANDE DO NORTE
Em uma trajetória de uma década, as empresas locais conseguiram reduzir em 50% o consumo de lenha, adotando práticas como o reaproveitamento de madeira e investindo significativamente em energia solar. Atualmente, metade das fábricas já utiliza essa fonte limpa para operar seus equipamentos necessários à produção de telhas e tijolos.
Vinícius da Costa Lima, presidente do Sindicato da Indústria Cerâmica do Rio Grande do Norte (SINDICER-RN), ressalta a importância da mudança: “O ceramista não pode mais contar com o mesmo combustível de sempre. A lenha está se tornando escassa, e precisamos nos adaptar.” Ele conta que o Banco do Nordeste “foi e está sendo muito importantes para o financiamento cerâmico”.
A modernização das fábricas também é evidente nas adaptações às exigências ambientais, como a redução drástica das emissões de fumaça pelas chaminés, graças à substituição de fornos por modelos mais eficientes em controle térmico. Empresários como Vargas Pessoa explanam os avanços tecnológicos, como o aproveitamento de resíduos de serrarias como combustível eficiente para a queima dos produtos cerâmicos.
“É possível controlar melhor a queima do pó de serragem, utilizando apenas o necessário“, explica Rinaldo Tavares, outro empreendedor do setor.
“O nosso setor está trabalhando dentro do padrão de emissões. O Conama exige um patamar de emissões de carbono. Hoje a nossa empresa está trabalhando abaixo de 10% do exigido pelo CONAMA.”, relata Vargas Pessoa.
BANCO DO NORDESTE
Estudos realizados pelo Instituto Nacional de Tecnologia, com financiamento da Agência Suíça para o Desenvolvimento e Cooperação, foram fundamentais para melhorar a eficiência dos processos produtivos em diversas regiões da América Latina, incluindo o Rio Grande do Norte, onde a maioria das fábricas foi beneficiada pela aquisição de novos fornos mais eficientes, graças a linhas de crédito do Banco do Nordeste (BNB).
Os resultados são palpáveis: o uso de lenha nativa foi reduzido em 50% nos últimos 10 anos, o que equivale a uma diminuição de mais de 49 mil toneladas de CO2 por ano no estado. Empresas que adotaram novas tecnologias também observaram um aumento na lucratividade, mostrando que sustentabilidade e eficiência não são apenas uma exigência, mas uma oportunidade para crescimento econômico e ambiental. Com metade das 123 cerâmicas potiguares já utilizando energia solar, o setor continua a implementar medidas de transição energética, reforçando seu compromisso com um futuro de desenvolvimento sustentável e crescimento contínuo para o estado.
“É um case de sucesso que pode ser mostrado em qualquer lugar do país e até do exterior. 90% das cerâmicas aderiram ao programa de eficiência energética de melhoria e isso é motivo de orgulho para aqueles que fizeram parte dessa história como o próprio Banco do Nordeste.”, afirma Francisco Diniz, coordenador de Estudos e Pesquisas do BNB.
CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE
A Resolução CONAMA Nº 436, de 22 de dezembro de 2011, promulgada pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), estabelece novos parâmetros para o controle das emissões de poluentes atmosféricos no Brasil. Complementando legislações anteriores, como as resoluções nº 05/1989 e nº 382/2006, a medida fixa limites máximos de emissão para fontes fixas instaladas antes de 2 de janeiro de 2007 ou que solicitaram licença antes dessa data. Esses limites são detalhados por tipo de poluente e tipologia de fonte, assegurando o uso de tecnologias ambientalmente adequadas ao longo de todas as fases operacionais das instalações.
De acordo com a especialista em Direito Ambiental, Brenda Camilli, os órgãos ambientais licenciadores são responsáveis pela implementação e monitoramento desses limites, podendo estabelecer restrições ainda mais rigorosas conforme as condições locais e a necessidade de preservação da qualidade do ar. A Resolução contribuiu significativamente para a mitigação dos impactos ambientais das atividades industriais e para a promoção de um desenvolvimento sustentável no país.
Além da substituição da lenha nativa por fontes sustentáveis como lenha de manejo e resíduos de podas, a indústria cerâmica potiguar tem se adaptado às exigências legais e de mercado. Em 2011, o CONAMA impôs o controle de emissões das chaminés, impulsionando um acordo entre as cerâmicas e o Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente do RN para modernização dos processos.
“Essas resoluções são muito importante, porque é um caminho mais rápido de resolver demandas…”, destaca Brenda Camilli, em relação à Resolução Conama N° 436/2011.
A regulamentação visa não apenas reduzir as emissões nocivas à atmosfera, mas também promover práticas de controle ambiental que considerem a capacidade de suporte do meio ambiente. A definição dos limites leva em conta a diversidade das fontes em termos de porte, localização geográfica e especificidades de poluentes liberados. Além disso, incentiva a aplicação de tecnologias de controle viáveis economicamente, já implementadas em larga escala no Brasil e no exterior.
Para os empreendedores do setor, a indústria de cerâmica vermelha do Rio Grande do Norte exemplifica um modelo de adaptação e inovação que alia tradição e modernidade com um forte compromisso ambiental. A modernização da cerâmicas, a implementação de tecnologias limpas e a redução do consumo de lenha nativa revelam um setor em transformação, capaz de equilibrar crescimento econômico e a responsabilidade ambiental. O exemplo do Rio Grande do Norte é um testemunho inspirador de como a indústria pode se reinventar para enfrentar os desafios contemporâneos e contribuir para um futuro ainda mais sustentável.