Tramita no Congresso Nacional, o Projeto de Lei 1904/24 que equipara o aborto realizado após 22 semanas de gestação ao crime de homicídio simples até mesmo no casos de gravidez resultante de estupro.
O texto foi apresentado pelo deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) e outros deputados da bancada evangélica. A proposta altera o Código Penal (CP), que atualmente não pune o aborto em caso de estupro e não prevê restrição de tempo para o procedimento nesse caso. O CP também não pune o aborto quando não há outro meio de salvar a vida da gestante.
Caso o projeto seja aprovado pelos parlamentares, o aborto realizado após 22 semanas de gestação será punido com reclusão de seis a 20 anos em todos esses casos e também no caso de gravidez resultante de estupro. A pena é a mesma prevista para o homicídio simples.
A professora e pesquisadora em Direito do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte (IFRN), Brenda Camilli, destaca que esse PL é um desrespeito com os direitos das mulheres conquistados ao longo dos séculos.
Ela ressalta que a luta por igualdade tem sido defendida historicamente em documentos normativos desde a Declaração Universal dos Direitos Humanos e outras normas nacionais, a exemplo da Lei Maria da Penha e a Lei do Feminicídio.
“Mais uma vez a mulher, até mesmo quando é violentada, acaba como culpada. É uma culpabilização da vítima. O fato do Projeto de Lei utilizar a palavra homicídio é fortíssimo, pesado e demonstra um total descuido com os direitos das mulheres.”, afirma.
A especialista destaca que esse PL viola diretamente vários artigos da Constituição Federal, inclusive o artigo 5°, que considera que todos são iguais perante a Lei. Brenda frisa ainda que questões religiosas e morais não podem sobrepor o Direito.
“Imagine uma mulher que passou por várias situações complicadas, muitas vezes como o próprio PL prevê, vítima de uma violência sexual, e vai passar por um procedimento cirúrgico difícil. Ela vai ter consequências físicas disso e, além disso, vai ficar enclausurada em uma penitenciária com pena de reclusão de 6 anos ou mais”.
Vale ressaltar que 6 anos seria a pena base, podendo a mulher ser condenada até a uma pena maior, porque a pena máxima para o homicídio simples (sem qualificadoras e agravantes) é de 20 anos. Isso representa o dobro da pena máxima para punir um estuprador (10 anos).
“Imagino o quão desumano seria uma mulher – que já passou por violações em seu corpo – estupro e o procedimento de retirada fetal – ter ainda seu psicológico totalmente dilacerado em um processo judicial.”, finaliza.