Por Lucas Aguiar e Filipo Cunha
As mãos firmes ajudam a mexer o grande caldeirão. A tradição secular do processo com o leite bovino virou rotina para o campeão mundial Lenildo Firmino. Mais conhecido como Galego da Serra, o potiguar natural de Jucurutu, na região Seridó do Rio Grande do Norte, é proprietário da queijeira artesanal que leva seu apelido.


(Foto: cedida – Galego da Serra)
Localizado a 226 km de Natal, o município Tenente Laurentino Cruz, também no Seridó Potiguar, comporta a queijeira que desde 2017 já recebeu 14 prêmios, inclusive a medalha de ouro como melhor queijo coalho em 2023 no Prêmio Queijo Brasil e a melhor manteiga do sertão premiada com medalha de ouro no Mundial do Queijo em 2024.
Galego da Serra conta que é um árduo trabalho, mas que vem colhendo bons frutos com reconhecimento em concursos nacionais e internacionais de seus produtos derivados do leite. Ele diz que o diferencial do seu queijo artesanal é o resgate histórico da receita, de uma cultura ancestral que é preservada pelos queijeiros artesanais do Rio Grande do Norte.
“O maior destaque do meu queijo de manteiga é o resgate da receita tradicional.
É um queijo que estava caindo no esquecimento e quase ninguém estava mais fabricando.
É uma receita antiga, com mais de 300 anos, que não vai nenhum aditivo, 100% natural”, diz.
O produtor revela ainda que fez Empretec em 2015 e realizou capacitações do Serviço de apoio às micro e pequenas empresas do Rio Grande do Norte (Sebrae RN).
“Já fiz várias capacitações pelo Sebrae que permitiram consolidar meu negócio.”, destaca.
Nos últimos anos, o Sebrae RN tem estimulado a produção de produtos lácteos artesanais. Com o objetivo de difundir o turismo cultural no Rio Grande do Norte, o projeto Rota do Queijo vem sendo desenvolvido para valorizar as queijeiras potiguares.
De acordo com o analista técnico do Sebrae, Acácio Brito, o setor de queijos artesanais teve um grande ganho no Rio Grande do Norte, sobretudo a partir de 2017 com a aprovação da Lei Nivardo Mello.
“O Sebrae tem uma atuação muito forte na região do Seridó, que é a principal região produtora de queijo do estado, mas também em todo o Rio Grande do Norte. A gente apoia com consultorias, com capacitações, com apoio na elaboração e adequação de projetos de queijeiras, no licenciamento ambiental, o apoio para que ele possa ter a certificação dos selos. Enfim, um conjunto de ações para fazer com que o queijeiro possa ter acesso ao mercado formal”, destaca Acácio Brito.
Para Guilherme Saldanha, Secretário Estadual da Agricultura, da Pecuária e da Pesca, o Rio Grande do Norte se tornou um modelo de sucesso no setor nos últimos anos. Ele diz que até 2017 não havia legislação estadual vigente para impulsionar o crescimento dos queijeiros artesanais.
“Atualmente temos cerca de 40 pequenos empreendimentos registrados, grande maioria deles como artesanal e também com muito orgulho, hoje nós temos uma política que realmente incentiva o pequeno produtor de queijo, especificamente os queijos artesanais, porque nós temos uma legislação que permite o registro sanitário e comercialização dos produtos dessas queijeiras.”, averba.
RIO GRANDE DO NORTE COLECIONA VENCEDORES
O queijeiro Manacés Leite, da Queijeira Fazenda Barreiras, no município de Encanto, começou seu empreendimento na pandemia. Ele conta que em pouco mais de 3 anos já carrega alguns prêmios e tem orgulho do seu trabalho.


“A queijeira representa hoje nossa dignidade. Na pandemia, eu perdi meu pai e fiquei meio aéreo. E um certo dia eu decidi investir no queijo. Somos eu e minha esposa produzindo. O queijo já faz parte da vida da gente. E o Sebrae vem nos ajudando, vem nos engrandecendo com isso. Estamos aí nessa luta.”, ressalta.
MERCADO DO QUEIJO TEM CRESCIDO NOS ÚLTIMOS ANOS
De acordo com o último Censo Agropecuário do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2017, o Brasil produz por ano cerca de 220 toneladas de queijo dos mais diferentes tipos. Dos cerca de 175 mil produtores de queijo, mais de 140 mil são agricultores familiares que produzem em média 150 mil toneladas por ano. Em 2019, o Sebrae divulgou o “Boletim Inteligência e Tendências de Mercado”, que revelou um aumento de 106,3% na quantidade de queijarias no território potiguar.
Ainda de acordo com dados do Sebrae de 2021, o Brasil é o quarto maior consumidor de queijos do mundo com mais de 818 mil toneladas, atrás apenas da União Europeia (9.135 mil), dos Estados Unidos (5.956 mil ) e da Rússia (1.367 mil). E a tendência é que o mercado de queijos continue a crescer. Dados da Statista 2024 revelam a projeção do volume de queijo negociado no mundo até 2028. Em 2019, eram cerca de 69,7 toneladas de queijo consumido. A projeção para 2028 é um aumento de 42% com cerca de 120,2 toneladas.
SEGURANÇA E QUALIDADE DO QUEIJO POTIGUAR
No Rio Grande do Norte, desde 2023 o monitoramento da qualidade em queijeiras acontece por meio de uma parceria entre o Laboleite da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e o Sebrae. De acordo com o Coordenador do Laboleite, Adriano Rangel, as análises começaram como pesquisa universitária. No entanto, começou-se a observar que existia uma carência muito grande da cadeia produtiva do queijo artesanal no Rio Grande do Norte.


(Foto: Adriano Rangel)
“A gente trabalha monitorando a qualidade do leite em parceria com o Sebrae por meio do monitoramento da qualidade do leite dos produtores de queijo artesanal, seja produtor individual ou aqueles produtores que tenham fornecedores. Isso tem uma importância vital para a manutenção da qualidade e a segurança junto aos órgãos reguladores.”, revela.
QUEIJO DE CABRA POTIGUAR TAMBÉM É DESTAQUE MUNDIAL
Não são apenas os queijos feitos com leite de bovinos que são destaque mundial. No município de Monte Alegre, a Queijeira Capril Buxada é especializada em derivados do leite de cabra. Vencedora de diversos prêmios nos últimos anos, a queijeira é reconhecida por ter o 6º melhor produto lácteo do mundo com a Manteiga Ghee Delícia de Cabrita, em 2022.
O proprietário da queijeira, Marcelo Paiva, revela que desde os 17 anos trabalha no ramo de leites. Mas, foi há pouco mais de uma década, quando começou a trabalhar com o leite da cabra que o reconhecimento chegou para toda a sua família. Atualmente, a pequena empresa tem um catálogo com cerca de 25 produtos derivados do leite de cabra .

(Foto: Agência Sebrae 2022)
Em 2024, a Manteiga Ghee Delícia da Cabrita foi motivo de mais uma alegria ao ganhar super ouro no concurso Mundial do Queijo do Brasil.
“Isso é uma glória para um pequeno tempo de trabalho com leite de cabra e já ter esse êxito. Isso é muito prazeroso. Me sinto um vitorioso. Nossa vida mudou nos últimos anos”, afirma o produtor artesanal.
SERIDÓ CONCENTRA MAIOR NÚMERO DE CAMPEÕES MUNDIAIS DO QUEIJO
Em 2024, produtores do Rio Grande do Norte conquistaram 9 medalhas no Mundial do Queijo do Brasil. No estado, o Seridó é a região que mais concentra as queijeiras no estado e concentra os maiores produtores dos queijos manteiga e coalho. Dos vencedores, 8 são da região Seridó. O evento expôs 1.900 produtos lácteos do Brasil e de outros 13 países.
Super Ouro
Manteiga da Terra do Zaca – Queijeira do Zaca – São João do Sabugi
Manteiga Ghee Delícia da Cabrita – Queijeira Capril Buxada – Monte Alegre
Ouro
Queijo Ancestral – Queijeira do Zaca – São João do Sabugi
Queijo de Manteiga – Laticínio Sertão Jucurutu – Jucurutu
Manteiga de Garrafa – Laticínio Sertão Jucurutu – Jucurutu
Manteiga do Sertão – Laticínio Sertão Jucurutu – Tenente Laurentino Cruz
Prata
Manteiga da Terra – Queijeira Dona Gertrudes – Caicó
Bronze
Queijo de Coalho – Queijeira Dona Gertrudes – Caicó
Queijo de Manteiga – Queijeira Galego da Serra – Tenente Laurentino Cruz
GLOSSÁRIO
EMPRETEC
Empretec é uma metodologia implantada pelas Nações Unidas, desenvolvida no Brasil com exclusividade pelo SEBRAE que busca viabilizar a competitividade empresarial, através do aperfeiçoamento das características individuais do próprio empreendedor.
ROTA DO QUEIJO POTIGUAR
A Rota do Queijo Potiguar tem como objetivo fomentar o turismo cultural e gastronômico no Rio Grande do Norte, proporcionando aos visitantes a chance de explorar as histórias, os métodos de produção e os sabores distintivos dos queijos e seus derivados locais.
LABOLEITE
O Laboratório de Qualidade do Leite (LABOLEITE/UFRN) está localizado no município de Macaíba, na Unidade Acadêmica Especializada em Ciências Agrárias da Escola Agrícola de Jundiaí. É referência na prestação de serviços em análises laboratoriais no seguimento de leite e derivados, mantendo rede de cooperação institucional técnico-científica no âmbito nacional e internacional.
LEI NIVARDO MELLO
LEI Nº 10.230, DE 07 DE AGOSTO DE 2017 – Dispõe sobre a produção e a comercialização de queijos e manteiga artesanais do Rio Grande do Norte.
MANTEIGA GHEE
A manteiga ghee é um tipo de manteiga que pode ser obtida a partir do leite de vaca, ovelha, cabra ou de búfalo, e que passa por um processo em que é feita a eliminação da água e dos elementos sólidos do leite, incluindo as proteínas e lactose, gerando um óleo purificado de cor dourada e levemente transparente.
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